Rachel (Eva) Frank nasceu em 1754 em Nikopol, atual Ucrânia, na época uma região do gigantesco império turco-otomano. Criada numa tradicional família de “Doenmeh” (judeus islamizados após a crise originada pelo falso messias de Esmirna Shabatai Tzvi), esta mulher impressionantemente culta, dedicou-se com afinco a desvendar os secretos do misticismo judaico; com direito inclusive a declarar-se messias.
Existem poucos dados biográficos acerca de Rachel, a filha de Jacob Frank (1726-1791), carismático falso messias do século 18. Ela recebeu este nome em homenagem a sua avó paterna Reischa Herschel. Em 1760 seu nome foi trocado para Eva, ao converter-se toda sua família ao Catolicismo. Estas conversões aconteceram na cidade de Varsóvia, e serviram, basicamente, para proteger a seita “sabataísta” (grupo de seguidores de Shabatai Tzvi), perseguida por judeus das comunidades da Galícia e da Podôlia.
Os judeus sabataístas, conhecidos por sua péssima reputação entre as comunidades do império otomano, viviam cometendo atos heréticos e mantendo quase diariamente comportamentos sexuais incestuosos; desmotivando outros círculos de judeus de preservar seus costumes milenares. Os devotos de Shabatai conservavam, em secreto, rituais proibidos pela lei judaica (Halachá); muitas vezes abandonando o recato e deixando de lado todo sentimento de humildade ordenado pelo Judaísmo.
O comportamento de Jacob Frank não foi melhor daquele apresentado por Shabatai Tzvi. Frank entendia que o judeu devia “passar de um estado de purificação para um estado de transgressão”, afrontando as leis e as proibições estipuladas na lei judaica, organizando orgias e cometendo atos impuros e incestuosos.
Jacob Frank jamais se enxergou como um judeu talmúdico, mas sim como um judeu cabalista. Com bastante frequência incitava judeus a práticas ilícitas, pois entendia que no advento dos tempos messiânicos, um novo código de leis iria prevalecer nas comunidades. Para Frank, inaugurar-se-á uma nova era, uma “era de misericórdia” que substituiria à “era haláchica” focada no “Juízo Final”. Por acreditar em ideias heréticas, Frank foi tomado prisioneiro e excomungado do Judaísmo em junho de 1756.
Tudo indica que Rachel Frank acompanhava seu pai Jacob em longas viagens, nas quais convenciam judeus em situação de vulnerabilidade, de ser ele o “Messias Prometido” para redimir o Povo de Israel. A mãe de Rachel, de nome Hannah Kohen, conhecida como “A Matronita”, preencheu um papel mítico de suma relevância, falecendo em 1770, quando a jovem filha completava 16 anos de idade.
Jacob Frank não permitiu que sua filha o deixasse ou casasse. Esta proibição foi imposta também a seguidores. Todos eles constituíam uma comunidade messiânica sustentada em uma vida sexual comunitária sem restrições, desrespeitando o sagrado matrimônio. Ele também exigiu que Eva permanecesse com ele na prisão quando foi encarcerado entre 1760 e 1772. O pai se referia a sua filha com uma citação do Zohar onde se descreve a Shekhinah como “uma bela donzela que não tem olhos” (Zohar, Mishpatim).
As poucas biografias escritas sobre Rachel Frank nos informam que ela se definia como a encarnação da “Shekinah” (Divina Providência), a representação e imagem feminina de D´us, enxergando-se ainda como a própria reencarnação da Virgem Maria. Em relação ao culto da mãe de Jesus é importante registrar que estamos falando do culto da “Virgem Nossa Senhora de Częstochowa”, devota padroeira da Polônia e uma figura extremamente venerada que atraia numerosos seguidores.
Para o escritor americano Jerry Rabow na sua obra “50 Jewish Messiahs: The Untold Life Stories of 50 Jewish Messiahs Since Jesus and How They Changed the Jewish, Christian, and Muslim Worlds” (2002), Eva Frank foi a única mulher judia a declarar-se messias. Naturalmente, seu messianismo contou com o apoio irrestrito de seu pai Jacob Frank.
Em textos sobre o Franquismo, Jacob chama a Rachel de “Eva Romanova”, apontando para o fato de ela ser filha ilegítima dele com a Rainha Catarina da Rússia (1729-1796). É sabido de que pai e filha visitavam Viena, ganhando a simpatia da Corte Real.
Após a morte de seu pai Jacob, em 1791; Rachel Frank passou a ser vista como um “mistério” transformando-se na líder do culto franquista. Ela e dois irmãos menores, Joseph e Rochus Frank, assumiram a direção da Corte em Viena e Rússia. Multidões de judeus continuaram a chegar a Offenbach, Frankfurt-am-Main e outras localidades onde o número de franquistas era considerável.
Em 1800 os Franks enviaram cartas, (todas escritas com uma tinta vermelha), a várias comunidades judaicas, solicitando o alistamento ao movimento messiânico como a imediata conversão ao Franquismo. Porém, os descendentes de Jacob Frank nunca tiveram nem a força nem o carisma para manter viva a chama do “Franquismo”. Desta forma, com o passar dos anos, as contribuições pecuniárias destinadas à seita foram diminuindo gradualmente, obrigando a Rachel a deixar sua ostentosa vida na Corte.
Em novembro de 1813, dias após a “Batalha de Leipzig” entre o exército de Napoleão Bonaparte contra a coligação da Rússia, Prússia, Áustria e Suécia; o Czar Alexander I, Imperador da Rússia, cavalgou de Frankfurt-am-Main a Offenbach para visitar a Rachel, confirmando desta forma seu status real.
No final de sua vida Rachel foi delapidando patrimônio e gastando o dinheiro da Corte; colhendo dívidas que podem ter atingido a exorbitante quantia de três milhões de moedas de ouro. Em 1816, no ano de sua morte, Raquel havia planejado abandonar a Corte rumo á Varsóvia, para voltar a liderar a seita do Franquismo. Mas o desejado momento nunca aconteceu. Já com idade avançada, recebeu uma ordem de arresto emitida pelo Duque de Hesse.
Mesmo com a reputação da seita comprometida, os últimos seguidores franquistas continuaram até meados do século 19. Dentre os mais destacados descendentes de Jacob e Rachel Frank encontra-se o advogado e juiz Louis Brandeis (1856-1941), Chefe da Suprema Corte dos Estados Unidos entre 1916 e 1939.
Bibliografia
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Maciejko, Paweł. The Mixed Multitude: Jacob Frank and the Frankist Movement, 1755-1816. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2011, págs. 170-176
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Elior, Rachel, Sefer Divrei ha-Adon le-Ya’akov Frank, In: Ha-Ḥalom ve-Shivero: The Sabbatean Movement and its Aftermath: Messianism Sabbatianism and Frankism (ed. R. Elior), vol. 2, 2001, Jerusalem Studies in Jewish Thought, vol. XVII, págs. 471-548
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