Netanyahu, o “Mufti” Al-Husseni e Adolf Hitler: Uma gafe desnecessária

Em 21 de outubro 2015, o premiê de Israel Benjamin Netanyahu, causou alvoroço ao declarar que Adolf Hitler somente queria expulsar os judeus da Europa conquistada, mas foi persuadido pelo Mufti de Jerusalém, Hadj Amin Al-Husseni, para exterminá-los. Acadêmicos de Israel e do mundo inteiro, políticos e jornalistas, membros da sociedade civil, ministros e até intelectuais palestinos; desmentiram suas palavras.

A chanceler da Alemanha Ângela Merkel, fazendo “mea culpa”, afirmou categoricamente: “O Holocausto foi responsabilidade total da Alemanha”, obrigando Netanyahu a retratar-se dizendo que “não quis dizer que absolvia Hitler de sua responsabilidade, mas que o fundador da nação árabe na Palestina mandatória queria destruir os judeus, mesmo antes que existira ocupação e  assentamentos”. Como vemos a polêmica declaração de Bibi pegou muito mal.

Sabemos que políticos cometem “gafes”. Netanyahu não é o primeiro nem será o último. A retratação do premiê foi algo positivo. Por outro lado, era esperado que a liderança palestina criticasse Netanyahu por sua infeliz afirmação; explorando politicamente a polêmica frase em benefício próprio. Porém, os intelectuais e políticos palestinos devem cuidar-se deste episódio histórico acontecido, uma vez que o Mufti é notoriamente conhecido por atividades pró-nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

O Terceiro Reich investiu pesado (com somas consideráveis) nas atividades do líder Hadj Amin Al-Husseni e outros dignitários árabes simpatizantes do Nazismo. Uma parte do orçamento da Chancelaria alemã e das SS de Himmler estava reservada para bancar ações contra os judeus na Terra Santa, especificamente a primeira revolta árabe da Palestina orquestrada pelo Mufti entre 1936-1939.

Já em 1937, o Ministro de Propaganda do Reich Joseph Goebbels, elogiava a “conscientização nacional e racial” dos árabes do Oriente Médio; notando que na Palestina “flamejam bandeiras nazistas, decorando-se casas com suásticas e retratos do Führer Adolf Hitler”.

Em 1941 o Mufti Hadj Amin Al-Husseni foi recebido em Roma e Berlim, por Mussolini e Hitler respectivamente. Ao ser entrevistado na Europa, ele declarou sem constrangimento: “Há uma semelhança absoluta entre os princípios do Islã e os princípios do Nazismo”.

A princípios da década de 1940 o Mufti Al-Husseni estabeleceu um “Instituto para a pesquisa sobre a questão judaica no mundo muçulmano” inspirado no modelo do Terceiro Reich. Em Berlim, este “Instituto” se localizava na Rua Klopstock, lugar em que até 1939 funcionava uma escola judaica. Desde Alemanha o Mufti fiscalizava políticas de propaganda, operações de espionagem, atos de sabotagem e recrutamento de muçulmanos nas milícias de nazistas nos países ocupados pelo eixo (Roma-Berlim-Tokyo) no norte da África e Rússia. Esta instituição dispunha ainda de estações de rádio em Berlim, Zenissem, Bari, Roma, Tokyo e Atenas. Destes lugares os árabes difundiam a propaganda pró-nazi na região de Oriente Médio.

Os quarteis gerais do Mufti em Genebra e Istambul lhe permitiam espalhar suas atividades de espionagem na Síria, Iraque e Palestina, mantendo contatos com agentes da inteligência alemã na Turquia.

Em 1940 Hadj Amin Al-Husseni solicitou à Alemanha que “ajude a resolver a questão judaica afastando os elementos judaicos na Palestina e outros países árabes, em concordância com os interesses nacionais e raciais dos árabes, de forma similar àquela utilizada para solucionar a questão judaica na Alemanha e Itália”.

Em 1943 o Mufti de Jerusalém instou o Reich a bombardear Tel Aviv e Jerusalém, “ataque que deverá ser feito com enorme força para obter um efeito duradouro”. Quando os “afrikakorps” comandados por Erwin Rommel invadiram o norte da África, Hadj Amin Al-Husseni não ocultou sua satisfação. Em uma carta datada 04/07/1943, escreveu: “Permita-me, Führer, expressar minha sincera alegria em nome do povo árabe, e meus melhores desejos pela vitória do Eixo no norte da África… Saiba que o povo árabe continuará lutando a seu lado, combatendo o inimigo comum [os judeus] até a vitória final….”

Alemanha logo retribuiu à cortesia do Mufti. Em carta datada 02/11/1943, Himmler elogia “a aliança natural existente entre o Nacional-Socialismo da Grande Alemanha e os muçulmanos, amantes da liberdade no mundo inteiro”. Anteriormente, em abril de 1942, o Ministro das Relações Exteriores do Reich, Joachim von Ribbentrop (nazista condenado nos Julgamentos de Nuremberg), enviou uma carta ao Mufti dizendo que “daria todo seu apoio aos países árabes oprimidos, em sua luta pela destruição de um Lar Nacional na Palestina”.

Entre 1942-1944, desde Berlim, Hadj Amin Al-Husseni trabalhou incansavelmente para impedir o resgate de judeus da Hungria, Romênia, Bulgária e Croácia. Um oficial alemão de nome Wilhelm Melchers, no decorrer dos Julgamentos de Nuremberg, chegou a afirmar que “o Mufti era um inimigo de ferro dos judeus, e que jamais ocultou seu desejo de ver todos os judeus mortos”.

Em 1947 a comunidade judaica mundial tentou, obviamente sem sucesso, levar também o Mufti a Nüremberg; acusando-o de cometer crimes de guerra envolvendo-se diretamente nos planos genocidas de Hitler. Al Husseni morreria de morte natural em Beirute em 1974.

Benjamin Netanyahu errou ao tentar valorizar a influência do Mufti sobre Hitler. A afirmação de que a ideia de liquidar os judeus da Europa não era do Führer e sim do líder árabe da Palestina, repercutiu muito mal na mídia internacional. Sem dúvida a maior autoridade árabe-palestina naquela época não era um santo, mas a infeliz declaração do Primeiro Ministro de Israel ilustrou, claramente, quão profundo é o abismo que separa as duas partes do conflito da Terra Santa.

A declaração de Netanyahu é perigosa, pois os revisionistas do Holocausto são criativos ao negar o crime cometido pelos nazistas, mas carece de apoio. No momento em que o Primeiro Ministro israelense absolve Hitler da ideia de exterminar o povo judeu (com a mesma fórmula mentirosa dos revisionistas), dá-lhes autoridade para discutir e questionar um fato histórico. Não é o mais importante saber se efetivamente foi Hitler ou Himmler quem teve a ideia da “Solução Final”.

O Holocausto do povo judeu, em sua integridade, foi perpetrado pelos nazistas. Obviamente muitos colaboraram, mas não é certo dividir a responsabilidade da ação. Netanyahu, “sem querer querendo”, parece ter fornecido armas aos revisionistas do Holocausto, corrente da qual fez parte o ex-presidente do Irã, Mahmmoud Ahmadinejad, criticado incessantemente pelo próprio Premiê israelense.